Por Patrícia Bezerra
Então, você é promovido ou contratado diretamente para assumir um cargo de liderança. Normalmente, as primeiras preocupações que temos são: quais atribuições terei? Como atingir as metas? Preciso manter meu outlook com o calendário sincronizado para não perder nenhuma reunião importante?
Obviamente todas essas e muitas outras preocupações são válidas e importantes. Mas, atuando há quase 14 anos à frente de equipes e tendo o prazer de liderar muitas pessoas de diversos seguimentos, afirmo com convicção que a primeira preocupação deveria ser: como serei o melhor líder que esse grupo já teve? Como engajo a minha equipe para se manter motivada? Como posso aplicar o princípio da isonomia tratando sim, todos como iguais, mas ainda assim respeitando as suas diferenças e a individualidade de cada um?
Posso dizer com propriedade e sem nenhum medo de errar: a parte mais difícil no cargo de liderança é gerir pessoas. É desafiador, mas também é extremamente recompensador. Gosto de pensar que contribui, diretamente ou indiretamente, no crescimento profissional de cada pessoa que passou pelas diversas equipes que tive a oportunidade de conduzir ao longo desses anos. E eu sempre aprendo mais com eles.
Mas, por qual motivo escrevo esse artigo sobre gestão de pessoas? O que tem ele de diferente de tantos outros que já vimos, lemos e estudamos ao longo dos anos? Explico: vivemos um momento importantíssimo de consciência social e laboral, especialmente em relação ao nosso mercado jurídico. Precisamos rever muita coisa, principalmente nossas práticas de gestão e liderança.
Recentemente, vieram a público muitos relatos de ambientes de trabalho tóxicos que levam os colaboradores ao limite seja pela excessiva carga de trabalho, pela condução errônea e abusiva dos gestores ou mesmo pela pressão abusiva das próprias corporações, jurídicas ou não. E isso, além de triste, é extremamente preocupante. Precisamos repensar os nossos valores, comportamentos e a nossa própria história profissional: que líderes queremos realmente ser? Que tipo de empresa queremos representar? Com quais comportamentos coorporativos temos sido coniventes, conscientemente ou não, e como fazemos para mudar esse cenário? Sim, essas preocupações precisam ser nossas também como gestores, ainda que esses fatos não tenham acontecido diretamente em nossos corredores.
Eu aprendi, na prática, que há diversas formas de gerir e liderar pessoas. Mas, particularmente, gosto da forma humanizada. Crio relações para a vida. Tenho prazer em motivar pessoas e, ao desenvolvê-las, entender e dar voz às suas histórias como indivíduos. Não gosto e nem pratico algumas frases que viraram verdadeiros bordões em algumas corporações, tais como: “aqui a bronca vem em cadeia, esquema pirâmide”; “do jeito que eu ouvir, vou repassar, batendo em quem for preciso”; ou ainda, práticas que não são traduzidas em forma de discurso, mas as quais são vivenciadas diariamente sem o menor pudor: “não saia para almoçar com seu time, pode demonstrar fraqueza”; “não seja amigo dos seus liderados, vão perder o respeito”; “você é muito boazinha, ninguém vai te dar crédito por você ser assim”.
Aqui, vale um ponto a ser destacado: meu networking hoje é incrível e a grande maioria dele é feito por pessoas que foram dos times por onde passei. Pessoas as quais tenho orgulho em dizer que participei da formação como profissional e como líder, que vejo voar e ganhar espaço cada vez mais, e com as quais hoje tenho excelentes trocas de trabalho justamente por sempre ter minha liderança pautada no respeito.
Escrevendo esse texto, me lembro, inclusive, que nem sempre tive a oportunidade de atuar em empresas que valorizam a verdadeira gestão de pessoas e que tratam o time de maneira respeitosa, inclusive os próprios líderes de equipe. E, em uma empresa com tal “política” passei por momentos difíceis. Gestão por conflito, motivando os líderes a se atacarem entre si e a transformarem as equipes em rivais. Certa feita, ouvi de uma então “coordenadora” de outra equipe que deveria designar meus estagiários para buscarem comida e café para mim, afinal de contas, eu estava em posição favorável e isso era obrigação de estagiário. Lamentável, para não dizer o mínimo!
E se você chegou até esse momento do texto, deve se perguntar: por que estou compartilhando esses fatos tão pessoais? A resposta é simples: não há como falar de gestão sem falar de pessoalidade. Eu não me formei como gestora, eu não atuo como gestora apenas quando estou nas horas de trabalho. Eu sou gestora. E ponto. Tenho amor por desenvolver e transformar pessoas, adoro trabalhar em equipe, gosto de liderar e me permito mudar constantemente por aprender com o meu time.
Novamente, vale uma pausa para olharmos no como, já que até agora só falamos no quê. Falar sobre gestão pode parecer fácil, mas como na prática, gerir, motivar, respeitar e incentivar uma equipe, respeitando a isonomia, mas também tratando com individualidade e pessoalidade? Primeiramente, amando o que se faz. É preciso amar o trabalho em que se está, e também gostar de pessoas. Em seguida, se encontrar em uma corporação que respeite os mesmos valores que você. Se não estiver em uma, o que fazer? Analisar pontos básicos: é falta de conhecimento? Habitualidade em se fazer as coisas do mesmo jeito por muito tempo? As pessoas estão dispostas a mudar e entender sobre respeito e valorização pessoal? Se a resposta for sim, vale a pena investir energia para ajudar esse lugar a mudar o comportamento com as pessoas. Agora, se a resposta for não, sugiro repensar sua carreira nesse ambiente.
O mais importante desse texto é nos fazer refletir sobre a importância que a gestão de pessoas tem não somente na carreira profissional do indivíduo, mas em sua vida como um todo. O trabalho afeta sim, diretamente, a vida pessoal. Não tem essa de separar as coisas, não misturar trabalho com vida pessoal. Quando um não vai bem, reflete no outro e vice-versa. Recentemente me tornei mãe e considerei sorte poder atuar em uma empresa que respeita a minha maternidade, flexibiliza os horários de trabalho em prol dos horários da minha filha, incentivou minha amamentação permitindo que eu fizesse pausas para tirar leite e por mais de uma vez já pude trazê-la para o trabalho nos dias em que não tem aula, e conto com a compreensão e colaboração do meu time, dos meus gestores e de toda a empresa para viabilizar essa rotina, que não é nada fácil. Agora, triste é ter que considerar esse comportamento como “sorte”, justamente por não ser o padrão no mercado de trabalho, especialmente com as mães. Mas, isso é pauta para outro artigo. Vamos focar na liderança de equipes.
Meu objetivo com esse artigo, que pela primeira vez não é escrito de forma técnica propositalmente, é pensarmos nas relações de trabalho de forma mais humana. Uma busca rápida no Google nos deixa assustados, face a quantidade de pessoas com transtornos psicológicos iniciados pela rotina e ambiente de trabalho. Isso quando não acabam em tragédias, como o recente estagiário que tentou tirar a própria vida, e ainda mais lamentável quando se concretiza. O que nossas empresas, escritórios e corporações têm feito para mudar essa cultura enraizada que a pessoa precisa escolher entre a vida profissional e a pessoal? Que o trabalho só é bem feito se você o fizer por 12h, 14h, sendo o primeiro a chegar e último a sair? Que só podemos construir uma carreira de sucesso sacrificando a família e seu tempo de qualidade com eles? Como nós, gestores, estamos atuando para mudar esse cenário com nossos times? Qual modelo temos sido para eles?
Por fim, acho de extrema importância deixar aqui a minha opinião pessoal sobre liderança e gestão de pessoas, por mais polêmica que possa parecer. Não acredito que um certificado, um curso ou qualquer outra graduação qualifique ou prepare verdadeiramente um gestor. Pode sim, aprimorar técnicas, ensinar conteúdo de qualidade dentre outras coisas. Porém, a formação real de um gestor se dá com gente, trabalhando verdadeiramente em equipe, estando integrado e inserido com seu time. Conceitos como open space, times de alta performance e desenvolvimento humano precisam ser parte do nosso dia a dia atual e futuro. Nosso papel não é apenas ocupando um cargo dentro de uma empresa, há sim uma função social ao gerir pessoas. Lidamos com outros seres humanos que possuem, dentre tantas características, sonhos, famílias… Não há como mudar o sistema atual sem a reflexão particular de cada líder em relação ao seu time e sua conduta na posição de gestor. Vamos errar como líderes? Muito provável que sim. Mas, como vamos nos redimir quando isso ocorrer?
O momento é para quebrarmos paradigmas, fazermos a diferença na vida das pessoas que confiam a sua carreira em nossas mãos. Precisamos sim gerir, entregar resultados, cumprirmos metas e inovar perante nossas empresas, mas nossa realidade atual e futura mudou nossas prioridades (e que bom que isso aconteceu). Hoje, a Patrícia que aqui escreve ama o que faz, é uma profissional apaixonada pela carreira e por gestão, mas eu trabalho para viver e não mais vivo para trabalhar, afinal de contas nossa saúde emocional é tão importante quanto a nossa carreira profissional e não só podem como precisam andar em parceria.