Para que você entenda as próximas linhas, eu preciso explicar um pouco do contexto de meu desenvolvimento profissional. No início da minha carreira, antes de entrar no setor de tecnologia, trabalhei por muitos anos como professor de música e maestro. Trabalhei com orquestras de câmara, corais e dei aulas de disciplinas estruturantes e práticas em cursos de graduação em música.
Tanto em ensaios quanto em aulas, sempre trabalhei com os músicos o processo de construção de uma interpretação musical. De acordo com o maestro Osvaldo Ferreira (citado por Charles Roussin em sua dissertação de mestrado) “reger é tomar decisões”. Cabe ao maestro ou ao intérprete o ato de decidir; não sobre o conteúdo da música (pois este já está escrito na partitura), mas sobre como as notas e frases musicais devem soar.
Seja na concepção de uma interpretação ou na orientação a algum aluno, sempre trabalhei com dois conceitos que norteariam esse processo: direção e propósito. Ora, qualquer elemento musical a ser interpretado deve ter uma direção clara, deve caminhar para algum lugar e deve ter uma razão de ser, um propósito, um motivo que embase aquela escolha interpretativa.
Sem direção, a música perde a vida, perde a sua narrativa e entra num processo circular que pode levar o ouvinte rapidamente ao enfado e à impressão de que está ouvindo uma máquina ao invés de um corpo de artistas. Já sem propósito, a interpretação pode ter elementos desconexos, “sem pé nem cabeça”, mais parecendo uma colcha de retalhos do que uma obra concebida sob a mais rigorosa forma.
Anos depois, agora à frente do time de Engenharia de Dados de uma das mais respeitadas consultorias especializadas em dados do país, tenho desafios um pouco diferentes. Gerenciar bem o time, atrair e desenvolver pessoas, definir e perseguir a estratégia da área, monitorar os resultados dos projetos e garantir que nossos clientes sempre estejam à frente do mercado no que toca a dados são alguns desses desafios. O curioso é que mesmo agora, neste novo contexto, as palavras direção e propósito ainda me acompanham. De que forma?
Nas diversas decisões que um gestor toma em seu dia a dia, sejam relacionadas à estratégia de médio/longo prazo, sejam relacionadas à operação, é imprescindível que cada decisão seja orientada a metas claras e estabelecidas que se deseja alcançar e ainda que essas decisões estejam bem fundamentadas, que façam sentido dado o contexto da organização, a cultura, o cenário e os demais fatores que interferem no dia a dia da empresa. Embora esses dois conceitos sejam amplamente conhecidos e reconhecidos como condição sine qua non para a boa gestão, existe uma diferença abismal entre saber o que se deve fazer e de fato ser capaz de fazê-lo.
É bastante comum encontrarmos gestores (em sua grande maioria jovens ou em sua primeira liderança) que não definem uma direção para a sua condução. Eles não definem metas claras e bem estabelecidas, ou se as definem, as abandonam no meio do caminho. Caso tenham boas metas, é comum não ter uma mensuração e controle adequados para aferir se os resultados foram ou não atingidos. Isso conduz o time e a organização à mesma sensação citada anteriormente de estar “andando em círculos”, sem direção, o que leva à desmotivação e ao questionamento constante se a organização (ou o gestor) possui maturidade suficiente para o negócio ao qual se propõe.
É igualmente comum encontrar jovens gestores que iniciam um projeto ou uma ação sem clareza do propósito, do porquê de aquilo ser levado a cabo. Eles não têm profundidade no contexto organizacional, por vezes começam trabalhos que já estão sendo realizados por outros times, sem sinergia, e às vezes podem até mesmo realizar algo que os afasta dos objetivos centrais da organização.
Decisões com direção clara inspiram todo o time a olhar para o mesmo lado, perseguir os mesmos objetivos, mensurar seus resultados e ter controle, a cada novo ciclo de trabalho, se estamos nos aproximando dos nossos objetivos, nos afastando deles ou andando em círculos. A direção clara permite que os objetivos da organização sejam alcançados com menor esforço e de maneira mais consolidada, sempre ancorado em dados, mostrando o antes, o depois, e o impacto das ações realizadas.
Decisões com propósito dão sentido ao trabalho das pessoas. As pessoas compreendem o que fazem, o contexto de suas ações, conseguem enxergar e posicionar suas atividades dentro da grande estratégia da organização, e por consequência, se sentem mais motivadas no seu dia a dia. Há poucas coisas que desmotivam mais um profissional do que não entender por que uma tarefa qualquer deve ser executada. Quando esse porquê é clarificado cria-se um sentimento de pertencimento daquilo que eu estou fazendo dentro do contexto da organização.
Em suma, seja na música, na execução de uma tarefa técnica ou na tomada de decisão que vai impactar um time inteiro na organização, é importante lembrar-se de que ter uma direção clara permite perseguir de maneira eficiente os grandes objetivos da organização e ter um propósito claro dá sentido ao trabalho.