Por Camilla Pinheiro
O título desse artigo, à primeira vista, pode parecer a você, leitor, demasiadamente pretensioso. Afinal, quem é essa autora que escreve sobre quebras de paradigmas na advocacia? Em quais títulos ela se apoia ao pretender inaugurar novos paradigmas na gestão de escritórios e departamentos jurídicos?
Não, eu não estou me propondo a inaugurar uma nova era da gestão jurídica. Tampouco possuo algum conhecimento secreto capaz de desbancar tudo que já foi escrito, ensinado é dito sobre gestão na advocacia.
É de conhecimento comum que a sociedade, o mercado, a economia, tudo isso tem se transformado em velocidade vertiginosa, especialmente nas últimas décadas, em decorrência, dentre outros fatores, da evolução tecnológica acentuada.
O mercado jurídico não fica para trás nesse quesito de transformações e tecnologias.
Em 2017, o professor britânico Richard Susskind, um dos maiores especialistas do mundo em tecnologias jurídicas e futuro do mercado jurídico, previu em sua obra “Tomorrow’s Lawyers: an introduction to tour future” que o mercado jurídico passaria por mais transformações nos próximos 20 anos do que em todos os séculos passados.
E aqui estamos nós, advogados, bacharéis em Direito, gestoras jurídicas, dois anos após o início de uma pandemia, revirados do avesso no que diz respeito às nossas atividades profissionais. Lidando com uma constante pressão para empregar mais esforços no marketing digital, na adoção de ferramentas tecnológicas, na aceleração do processo de transformação digital de nossas organizações jurídicas.
Somos diariamente compelidos a quebrar paradigmas em nossas organizações e práticas jurídicas, abandonando tudo aquilo que já não faz sentido no mundo atual.
Aqueles que seguem o fluxo das transformações e voluntariamente procuram fazer os ajustes de rota necessários para navegar nas águas turbulentas da tempestade tecnológica, não só se tornarão melhores marinheiros, como também chegarão a melhores destinos.
Há, todavia, os que insistem em manter práticas que não se encaixam nessa nova realidade e refutam o novo, ou por não compreenderem muito bem, ou pelo medo de terem que colocar a si mesmos, suas crenças, valores, aprendizados e experiências em cheque.
Para esses, especialmente, na intenção de contribuir para um olhar mais esclarecido e acolhedor sobre todas essas transformações, é que, agora, retomo os questionamentos do início e abro a minha caixa de experiências profissionais para contar quem é essa autora que vos fala em novos paradigmas na advocacia.
Aos que necessitam de títulos e pompas para serem concedidos, sou advogada já 10 anos, sócia de um escritório de advocacia enxuto, mas com atuação nacional. Possuo um MBA em Planejamento e Gestão de Escritórios de Advocacia é uma certificação em Management pela University of Akron (Ohio). Sou uma dos 27 líderes de inovação jurídica entrevistados para uma pesquisa sobre Liderança e Inovação no Direito conduzida pela FGV Direito São Paulo. Atuo, ainda, como professora e coordenadora de programas de pós-graduação em todo o país, sempre em temáticas relacionadas a Inovação e Gestão Jurídica, Futuro do Direito, Direito e Tecnologia. Atualmente, estou como Diretora de Inovação do Instituto Goiano de Direito Digital.
Mas não é nenhum desses títulos que me encoraja a falar sobre novos paradigmas na advocacia. O que me encoraja, e me confere a autoridade necessária para tratar do assunto, é somente uma coisa: a disposição para questionar a mim mesma, de forma obstinada, constante e proativa.
Muitas vezes esperamos a pressão externa para nos questionarmos.
Esperamos que o mercado cobre que estudemos empreendedorismo e gestão, mesmo sabendo desde sempre que deveríamos ter buscado esses conhecimentos há muito mais tempo, já que a faculdade não nos ensinou.
Esperamos os clientes minguarem para decidirmos finalmente posicionar nossa marca jurídica na internet, porque não estamos dispostos a lidar com nossos medos de nos expor ou de falar em público.
Esperamos perder um prazo para decidirmos contratar ferramentas tecnológicas que nos auxiliem na gestão, porque não estamos dispostos a admitir que a gestão analógica que aprendemos, em agendas ou planilhas de Excel, não serve mais. Porque não queremos mudar nossas práticas que, consolidadas ao longo dos anos, nos dão a falsa sensação de uma sabedoria profissional que não queremos abandonar.
A verdade é que, quando falamos de novos paradigmas, estamos falando muito mais sobre a necessidade de disposição interna para modificar a nós mesmos e, por consequência, nossa profissão e organização jurídica.
O adjetivo “novos” não se refere somente ao oposto de “velhos”, no sentido de se buscar paradigmas atualizados que substituam as antigas premissas e práticas de um mundo analógico e linear.
Ele também, e principalmente, se refere a algo que nunca foi feito anteriormente, de modo que cada vez que abrimos a mente para a possibilidade de uma nova prática, um novo modelo de gestão, uma nova tecnologia, estamos inaugurando novos paradigmas na nossa própria advocacia e provocando inovação naquele contexto em que estamos inseridos.
Isso requer um exercício constante de auto obsolescência programada: olhar para dentro das nossas organizações jurídicas e, de forma voluntária, tentar encontrar aquilo que precisa de mudanças, aquilo que parece estar na contramão do fluxo do mercado, antes mesmo que qualquer outra pessoa ou situação nos pressione a fazê-lo.
Tenho a felicidade ter acompanhado e ainda acompanhar diariamente os resultados de colegas e alunos que têm se proposto a fazer esse exercício, questionando a si mesmos de forma obstinada, constante e proativa:
O que será que eu posso mudar hoje na minha forma de pensar, nas minhas habilidades, nas minhas práticas para transformar minha carreira ou meu escritório de advocacia?
Quais tecnologias estão impactando o mercado jurídico que eu preciso conhecer?
Quais demandas estão latentes nessa nova sociedade que eu deveria estar explorando?
Nessa minha contribuição inaugural ao portal, escolhi reforçar o convite que faço, juntamente com outros 12 autores, em minha obra também intitulada “Novos Paradigmas para Gestão na Advocacia”.
O convite de se tornar um agente de transformação no mercado jurídico, ao invés de ser aquele barquinho perdido no oceano remando contra a maré.
O convite para parar de “se adaptar” à pressão do mercado e começar a adotar a inovação jurídica como estratégia.
O “novo”, mais do que nunca, está presente, latente, acessível e essencial. Conte comigo para trazê-lo para dentro de sua organização jurídica.